terça-feira, 22 de maio de 2012

BRASIL - UM PAÍS DE TODOS COMO IGUAIS


Faculdade Zumbi dos Palmares incentiva afrobrasileiros a estudar


Em funcionamento desde 2004 em São Paulo, instituição reserva 50% das vagas a afro descendentes, que ainda somam apenas 13% dos universitários do país.


SÃO PAULO, Brasil – Enquanto a diversidade gradativamente começa a ocupar os bancos acadêmicos do país, a discussão sobre cotas raciais em universidades públicas voltou ao Supremo Tribunal Federal (STF).
Os dez ministros do STF que participaram da votação sobre cotas em universidades federais em 25 e 26 de abril foram unânimes: o sistema não fere a Constituição.
Apesar da polêmica que ações afirmativas ainda geram no país, o caminho à universidade está cada vez mais acessível aos afrodescendentes.
Até 2000, apenas 2% dos universitários brasileiros eram negros, de acordo com a ONG Sociedade Afrobrasileira de Desenvolvimento Sociocultural (Afrobras), que luta pela inclusão dos negros no ensino superior.
Atualmente, o índice é de 13%, segundo o Ministério da Educação (MEC).
“A situação está um pouco diferente em função do ProUni, que possibilitou a muita gente de baixa renda estudar em universidades particulares (com a oferta de bolsas de estudos)”, diz Francisca Rodrigues, diretora de comunicação da Afrobras. “Mas a proporção ainda é bem pequena se considerarmos que 51% da população é negra ou parda.”
Programa Universidade para Todos (ProUni) do governo federal reserva bolsas a portadores de deficiência, indígenas, pardos e negros. O número de cotistas é proporcional à sua distribuição na população, com base nos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Do total de 919.551 bolsas distribuídas pelo ProUni em todo o país de 2005 a 2011, 35,34% foram para estudantes autodeclarados pardos e 12,51% para os que se autodeclararam pretos.
Além disso, 51 dentre 123 instituições de ensino superior públicas adotam cotas para negros, conforme o estudo “Mapa das Ações Afirmativas no Brasil”, divulgado em 2011 pelo Instituto de Inclusão no Ensino Superior e na Pesquisa.
Em tramitação na Câmara dos Deputados, projetos lei (PL 3627, de 2004, e PL180, de 2008) querem tornar obrigatória a reserva de vagas para estudantes egressos de escolas públicas, em especial negros e indígenas, nas instituições públicas federais de educação superior. E o PL 6630/2002 determina que os repasses do Fundo de Financiamento ao estudante do Ensino Superior deem prioridade absoluta aos alunos afrodescendentes e ameríndios.
Antes mesmo que essa discussão chegasse ao Congresso, os diretores da Afrobras, que reúne intelectuais, autoridades e personalidades públicas, propuseram a criação da Faculdade Zumbi dos Palmares.
A ideia foi defendida em 2000 junto ao MEC, como estratégia de inclusão dos afrodescendentes em todas as esferas da sociedade.
Em 2003, o MEC autorizou o funcionamento da faculdade, na capital paulista. Os primeiros cursos de graduação foram abertos no ano seguinte: Administração, Direito, Publicidade e Propaganda, Pedagogia e Tecnólogo em Transporte Terrestre.
Em 2013, ainda devem ser oferecidos os cursos de Tecnólogo em Recursos Humanos e Tecnólogo Financeiro.
Primeira faculdade idealizada por afrodescendentes na América Latina, a Zumbi dos Palmares leva o nome do principal líder negro brasileiro.
Zumbi foi um líder notório do Quilombo dos Palmares, comunidades fundadas por volta de 1580 no Nordeste do país, que reuniam escravos libertos e fugitivos. Capturado pelos colonizadores portugueses, Zumbi foi morto em 1695.
Até hoje, seu nome é sinônimo da luta pela igualdade racial no Brasil, onde a escravidão foi abolida em 1888.
Educação para todos
A Faculdade Zumbi dos Palmares pode ajudar a diminuir diferenças históricas na educação de brancos e afrodescendentes no país.
Em média, os negros brasileiros têm 6,2 anos de escolaridade, contra 7,2 anos dos brasileiros de outras raças, aponta o Observatório da População Negra, criado pela Faculdade Zumbi dos Palmares, juntamente com as Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República e a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial (Seppir). Entre os analfabetos brasileiros, 69% são negros.
A baixa escolaridade se reflete no salário: afrodescedentes recebem R$ 464 ao mês, em média, contra R$ 640 pagos aos demais brasileiros.
Dos 16,2 milhões de pobres do país, 11,5 milhões são pardos ou negros, segundo o Censo de 2010 do IBGE.
Acreditamos que só com educação as pessoas conseguirão galgar degraus, se inserir na sociedade e cobrar seus direitos”, diz Francisca.
Liberdade pela educação
A Faculdade Zumbi dos Palmares também foi a primeira do Brasil a seguir a Lei 10.639, de 2003, que obriga o ensino da história e cultura afrobrasileira.
Além do compromisso com a diversidade no currículo, 50% das vagas são reservadas a calouros afrodescendentes. Atualmente, 87% dos 1.800 alunos matriculados se declaram negros.
A Zumbi adotou diversas medidas pedagógicas para facilitar a graduação superior de afrobrasileiros com dificuldades financeiras e formação educacional básica deficiente:
·        Como 99% dos estudantes concluíram o ensino médio em escolas públicas, há aulas de reforço para alunos com dificuldade de aprendizagem;
·        Já que a maioria dos universitários trabalha, todas as aulas são noturnas;
·        A mensalidade custa, em média, R$ 290, por 400 horas de aula por semestre.
·        “O valor foi determinante para minha escolha”, confirma Tatiana da Silva Barros, de 25 anos, que se formou em Administração em 2011 e hoje trabalha para o departamento jurídico de um banco. “Ao nos dar essa oportunidade , a faculdade incentiva outros negros a estudar.”
·        Alunos com mais dificuldades financeiras ainda podem concorrer a bolsas de estudos, que cobrem 50% ou 100% da mensalidade.
·        Renato Manoel de Souza, 32, é um dos beneficiários.Estudante de Pedagogia, ele paga o curso com aulas de capoeira, que ministra três vezes por semana na faculdade.
·        Primeiro integrante da família a sentar em um banco acadêmico, Souza já convenceu um primo a fazer faculdade. Agora, tenta incentivar uma irmã, um sobrinho e os vizinhos.
·        Essa rede de influências positivas é comum na Zumbi: 8 em cada 10 candidatos foram influenciados por alunos matriculados.
·        “Aqui eu me sinto em casa: todos vêm cansados do trabalho”, brinca Ricardo Henrique Rocha, 19, indicado por um amigo. “A metodologia (de ensino) pode ser a mesma das demais (faculdades), mas a visão da instituição se reflete na vida de todos que estudam aqui”.
·        Rocha, que estuda Administração, pretende cursar Publicidade depois da primeira graduação. Concluídos os estudos, quer ingressar na política.
·        Oportunidades no mercado de trabalho
·        Com programas de estágio com empresas como Bradesco, Carrefour, Ford, Nestlé e Mercedes, a instituição facilita o ingresso dos alunos no mercado de trabalho.
·        A maioria dos estudantes – 85% – conclui a faculdade empregados.
·        “Tentamos consertar o passado, desenvolvendo pessoas no presente e dando oportunidades a elas no futuro”, garante Ulisses Mormile, professor de Sociologia e Filosofia. “Nós preparamos o aluno para a sociedade e lhes damos acesso às empresas.”
·        Thiago Pereira Ribeiro, um rapper de 28 anos conhecido como Thig, cursa o segundo ano de Administração e já conseguiu estágio em um banco. Ele conta que o sucesso de amigos que se formaram na Zumbi influenciou sua escolha pela instituição, mas o senso de pertencimento foi o que mais pesou.
·        “O ser humano precisa se identificar com seu meio”, diz. “Por isso, precisamos de presidentes negros, personalidades negras, apresentadores negros na TV.”

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